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Literatura Latina


 

As Metamorfoses", de Ovídio.

 

Ovídio narra as origens do universo através da evolução derivada de nascimentos divinos. Escreve a formação da Terra e dos astros, o surgimento dos homens e a formação da civilização. O caos estabelece um estado primitivo do universo. O autor também utiliza quatro idades das eras cronológicas. Tais idades são seguidas da luta entre os Gigantes e os Deuses olímpicos. Há uma decadência entre as idades, sendo que a última, denota o declínio da moralidade e o surgimento de homens perversos, desejosos de cruéis matanças. As quatro idades representam o cenário no qual evoluem os homens e no qual deuses produzem metamorfoses como desvios que transgridem tanto as formas gerais da natureza quanto as leis que a regem. Até o céu viu-se ameaçado, um motim de gigantes, tenta apoderar-se do reino celeste. Júpiter, porém, com seu cetro expelindo raios, golpeou-os a todos, acabando com a revolta. Cercados pela corrupção e pela infâmia, os homens não fazem senão exercitarem-se no crime. Nas cidades, nas ruas, quem se apropria de tudo são os descendentes de Licáon, o grande lobo.

 

A era dos homens deu lugar ao domínio dos brutos. Então Júpiter, convocando Netuno, açoitou a Terra com um dilúvio purificador. Logo que a chuva começou a cair, Deucalião embarcou juntamente com a mulher na balsa e nela permaneceram até o fim da tormenta. Os dois sobreviventes recolheram várias pedras que jaziam no chão e, atirando-as para trás, perceberam que imediatamente transformavam-se em homens as atiradas por Deucalião e em mulheres as atiradas por Pirra. Dessa maneira, os dois esposos conseguiram repovoar toda terra. Surgiram outros animais, a água se aqueceu, surge então a enorme Píton (serpente), motivo de terror, mas abatida por Apolo com seu arco e flecha. Perante a arrogância de Apolo como vencedor de Píton, Cupido decidiu fazer-lhe frente. Para lhe mostrar a superioridade das suas flechas, mandou duas, uma de ouro, com o poder de atrair o amor, sobre Apolo, e uma outra de chumbo que afastava o amor sobre a bela ninfa Dafne. Ferido por Cupido, o deus foi tomado de amor pela ninfa, esta tentou escapar-lhe, pedindo a seu que a salvasse mudando-lhe a forma do corpo. Peneu fez o que a filha pediu... transformou-a num loureiro. Io despertou a paixão de Zeus, que, para cortejá-la, cobriu o mundo com um manto de nuvens escuras, escondendo seus atos da visão de Hera. A estratégia falhou e a deusa, desconfiada, desceu do monte Olimpo para averiguar o que estava acontecendo. Numa vã tentativa de iludir sua esposa ciumenta, o deus transformou sua amante em uma belíssima novilha branca. Intrigada pelo interesse do marido no animal e maravilhada com a beleza do mesmo, Hera exigiu a novilha para si e a pôs sob a guarda do gigante Argos Panoptes. Argos quando dormia mantinha abertos cinqüenta de seus cem olhos. Mas Io conseguiu fugir. O Livro I termina com a história de Faetonte, intrigado com a descoberta de ser filho sol.

 

 

Analise do tipo de texto utilizado por Ovídio em "As Metamorfoses".

 

Trata-se de uma narrativa épica genealógica. A gênese do Universo e a trajetória dos deuses, dos semideuses e dos homens. Não é um poema de grandes dimensões, seguiu o modelo de um "poema coletivo", que reúne diversas histórias autônomas, porém, com um tema comum.

 

A épica é um gênero literário no qual o autor apresenta de forma objetiva fatos lendários ou fictícios acontecidos num tempo e espaços determinados. O autor usa como forma de expressão a narração, mas a descrição e o diálogo também são usados.

 

A épica (ou epopéia) é uma longa narrativa literária de caráter heróico, grandioso e de interesse nacional e social que apresenta, juntamente com todos os elementos narrativos (o narrador, personagens, tema, enredo, espaço e tempo), uma atmosfera maravilhosa que, em torno de acontecimentos históricos passados, reúne mitos, heróis e deuses, podendo-se apresentar em prosa ou em verso.

 

O gênero épico desenvolveu-se em várias civilizações e em vários momentos históricos, mas os seus modelos insuperáveis são a Ilíada e a Odisséia, epopéias surgidas na Grécia por volta dos séculos IX e VIII a.C., ou mesmo do século IX a.C. Estas obras, como outras similares, foram denominadas também poesia épica, isto porque - possivelmente com objetivo de memorização - eram metrificadas. Costuma-se dizer que a última grande manifestação de poesia épica no Ocidente são Os Lusíadas, de Camões, que veio à luz em 1572.

 

 

 

Comentários livres e análise do texto

 

No que concerne ao Livro I de As Metamorfoses, Ovídio descreve a gênese do Universo demonstrando uma razão apurada, haja vista o fato de conservar diversas interpretações sobre mitologia cosmológica, bem como ensejar discussões sobre as relações contraditórias concernentes às diferentes opiniões doutrinárias.

Com o fito de arquitetar a formação do mundo, Ovídio constrói seu texto sobre o manto de outras obras. O autor abebera-se de Hesíodo (evolução formada de nascimentos divinos) e de Lucrécio (descrição da formação da terra e dos astros, aparecimento dos homens e constituição da civilização). A noção de caos, como inicial desordem dos elementos universais, retoma Hesíodo.

Os deuses metamorfoseiam os seres humanos para demonstrar sua condição mais elevada perante os mortais. Já no Livro I, há algumas descrições de metamorfoses no poema ovidiano: em mamíferos (Io), em planta (Dafne). Todavia, o sentido amplo dessas transformações demonstra que, apesar de transmutados para diversas formas, esses seres não deixam de manter indícios de sua natureza anterior.

Em verdade, a metamorfose representa um necessário ambiente narrativo que se divide em elucidar os deslocamentos de classe reclamados pela narrativa mítica, bem como conceber emoções à imaginação, o que faz com que o texto seja provocativo, comovente e interessante. Outrossim, o extraordinário de transmutar-se em algo diferente pode ser interpretado como uma alteração da consciência.

Ovídio também utiliza quatro idades das cinco eras cronológicas da mitologia clássica. Essa redução pode ser uma associação com os pontos-cardinais, ou com as quatro estações do ano.

Na Idade de Ferro (a última Idade), observa-se o fim da moralidade e o surgimento de homens cruéis, desejosos de sangue e destruição. Essa Era, localizada num tempo distante, ainda encontra reflexo nas atividades delituosas dos nossos dias.

Destarte, o símbolo das Quatro Idades denota o palco onde surgem os seres humanos e onde os deuses realização suas metamorfoses transgressoras das leis da natureza.

O amor, em Metaformoses, é visto como amor à primeira vista. Haja vista o episódio de Dafne e Apolo. No mesmo Livro I, a distinção entre amor e luxúria é que os personagens que amam enxergam a pessoa amada como bela física e interiormente, enquanto que os luxuriosos a enxergam apenas como mero objeto sexual. Isso está presente no mito de Io e Júpiter, onde o deus nunca comenta acerca da beleza da jovem, apenas diz que ela faria um macho feliz na cama.

Outra forma de se analisar o amor em Ovídio, é a perda do controle racional, como característica de uma pessoa no ápice do amor. Essa marca se encontra ainda no mito de Dafne e Apolo, quando ela foge dele, e ele pede para que ela encurta os passos a fim de não se machucar: ele diz que também desacelerará para que ela não precisa correr mais rápido, mas quando ela não o faz, ele acelera. No final, notamos que o amor de Apolo é tão intenso e doentio que, quando Dafne está tentando fugir dele, o deus não entende que é porque ela não o ama. Essa irracionalidade no pensamento é uma forma de defesa, a inconsistência na negociação e, finalmente, a frustração por não ter convencido a pessoa adorada.

Metamorfoses dispõe acerca de vida e morte, de incoerências e de desavenças entre as mais estreitas relações parentescas e íntimas, entre divindades, competição, poder, dominação, etc. O poema de Ovídio traz as ideias de bonança e de adversidade, além da noção de trabalho, posto que o homem começa a agir sobre a natureza para extrair de sua terra o sustento e a sobrevivência.

Por outro lado, os deuses, semideuses e humanos se transformam, assumem outras formas. Tal característica presente em várias tradições culturais e religiosas suscita a ideia de que o poeta já apresentava o objetivo da reciclagem e a prática de que é possível reaproveitar materiais e transformá-los em uma segunda coisa que, em essência, permanece a mesma.

Um dos trechos iniciais de Metamorfoses ("Então nasceu o homem, dizem, à imagem de Deus,/ ou da Terra, talvez, que tão recentemente apartada/ do velho fogo dos céus, ainda retinha/ alguma semente da força celestial que encantou/ os deuses ao surgir com vida do barro e da água"), cujo vínculo primário é estabelecido com a Terra, pode ser entendido, sob essa perspectiva de sustentabilidade, como a luta de grande parte dos movimentos planetários para salvar a própria Terra.

Como remate, conclui-se que no livro I de Metamorfoses, há a preocupação em relatar a origem do mundo. Cabe-nos pensar se há uma tentativa de construção de um novo cenário estético-literário, em que o homem é posteriormente apresentado e, a partir daí, os seres passam a ser passíveis de transformações.

 

No início, a natureza possuía uma só forma, que era chamada de Caos. Graças à ação de um deus, qualquer que tenha sido (Ovídio opta por não apontar qual seja), é que a terra começa a adquirir o seu formato, capaz de sustentar o homem e outras formas de seres vivos e não vivos. Por meio dessa cosmogonia, o eu lírico também vai moldando o seu cenário ideal, o qual já sofre mudanças desde o início e será, posteriormente, palco de diversas metamorfoses. Logo, nesse contexto, Ovídio aproxima-se do Deus Criador, tornando-se também um artífice.

 

 

BIBLIOGRAFIA

 

Institucional UNIVERSIDADE CASTELO BRANCO, Literatura Latina I, Rio de Janeiro: UCB, 2008.

 

LINS, Luiz Roberto. Metamorfoses. Disponível em: < http://pt.shvoong.com/books/classic-literature/1709005-metamorfoses/ > Acesso em 20 de outubro de 2009.

 

CARDOSO, Zélia de Almeida. A Literatura Latina. Edição revista, São Paulo: ed. Martins Fontes, 2003


TRIMALQUIÃO, o "novo-rico" romano de Petrônio.

 

Na fala de Trimalquião, Petrônio fez que se unissem o riso e a angústia em um elo de forças que ainda hoje, incita o leitor a refletir sobre seu tempo e sua consciência humana.

Trata-se de protesto altamente esclarecedora, cuja importância reside no fato Petrônio nos apresentar, de forma cômica e zombeteira, nossa condição humana frente ao sistema social castrador de nossas ilusões. Num contexto de oposições e na reunião de contrários, encontra-se no discurso de Petrônio, viva expressão poética de humor sobre o perene do ser humano através dos séculos.

 

Petrônio foi um literato romano autor de Satiricon. Nascido de uma família rica e nobre, foi conselheiro de Nero, sendo nomeado arbiter elegantiae (árbitro da elegância), em 63 d.C. Dois anos mais tarde, acusado de participar de conluio contra o imperador e caindo em descrédito, acabou com sua insólita vida, um misto de atividade e de libertinagem, no ano de 66 d.C., perpetrando um vagaroso e relaxado suicídio. Satiricon, uma história dissoluta de entretenimento, descreve as aventuras e desventuras do narrador, Encólpio, do seu amante Ascilto e do belíssimo servo, o jovem Gitão, que se intromete entre os dois amantes provocando ciúme e discussão. Juntamente com o poeta Eumolpo, embarcam em aventuras diversas acabando naufragados nas mãos de Circe, uma sacerdotisa do deus Príapo.

 

Dessa sátira insigne dos tempos do imperador Nero restaram apenas fragmentos, dos quais o mais significativo é o célebre Banquete de Trimalquião, onde se fazem descrições pormenorizadas dum jantar ostentoso, extravagante e decadente proporcionado pelo que se poderia chamar um "novo-rico" romano.

 

Lato sensu, Trimalquião é o exemplo privilegiado do liberto enriquecido, que aproveita a presença dos seus comensais para, entre expressões de grosseria e de mau gosto, ufanar-se da fortuna que acumulou. Será uma caricatura de Nero. Alguém que gosta de exibir sabedoria, o que se reflete na seleção dos convidados, em que se incluem os nomes de Agamémnon e Menelau, personagens da Ilíada de Homero, forma de Petrônio reescrever os clássicos e parodiar a erudição.

 

É precisamente no Festim (ou Banquete) de TRIMALQUIÃO que vamos encontrar Encólpio entre os convivas. Representam, numa escala reduzida, a Roma Imperial do século I . Trimalquião é um novo-rico que encarna todos os vícios da classe a que pertence, mas com uma densidade psicológica que ultrapassa as suas características sociais.

 

Trimalquião mostra as habilidades da sua cozinha, feita de pratos em cuja apresentação está subjacente a ideia de que nada é o que parece. Em suma, a ambiguidade e a teatralidade estão sempre presentes. Com as palavras "fez tudo isso", Trimalquião refere-se a um prato que parecia ser ganso engordado, rodeado de peixes e de toda a espécie de aves, e afinal era tudo feito a partir de uma única matéria, carne de porco. Eis aqui um exemplo perfeito do prato proteico, metamorfoseado, característico do exibicionismo do novo-rico patenteado numa cena onde tudo aparenta o que não é.

 

O banquete de Trimalquião, o mais bem estudado trecho de todo o Satiricon, não sem razão se destaca, a exemplo da memorável adaptação de Fellini para o festim, ao retratar a megalomania do novo-rico Trimalquião, cujo próprio nome, "três vezes rei", confirma as pistas de uma personalidade tirânica que, contrariamente ao banquete de Platão, impede os convivas de qualquer verdadeira meditação sobre o prazer. A encenação do funeral de Trimalquião é outro interessante episódio no qual uma sutil referência a Sêneca apontaria uma crítica de Petrônio à disparidade entre o modo de vida suntuoso do filósofo e o conteúdo de seus escritos morais.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

 

pleno séc. XXI, a leitura de Satiricon parece atrair uma atenção renovada, que suplanta o círculo de estudiosos da obra para ganhar um público mais amplo. Com a fala de Trimalquião, Petrônio fez que se unissem o riso e a angústia em um elo de forças que hoje, e indefinidamente, incita o leitor a refletir sobre seu tempo e sua consciência humana.

 

É neste contexto de oposições e na reunião dos contrários, que Petrônio nos patenteia a nossa condição humana frente ao sistema social castrador de nossas ilusões. Por isso, um espírito de sensibilidade, como o do moderno cineasta Fellini, veio a eleger a obra do Arbiter nas suas filmagens, pois encontrou no discurso de Petrônio viva expressão poética de humor sobre o perene do ser humano através dos séculos.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

      

SILVA, Amós Coêlho da. Narrationes Itineris. Disponível em: < http://www.filologia.org.br/xcnlf/6/02.htm >. acesso em: 19 de março de 2010.

 

FERREIRA, Paulo Sérgio Margarido, Os elementos paródicos no Satyricon de Petrónio e o seu significado. Lisboa, Edições Colibri - Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 2000.

 

LEÃO, Delfim Ferreira, As ironias da Fortuna: Sátira e moralidade no Satyricon de Petrónio. Lisboa, Edições Colibri - Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1998.

 

PETRÓNIO, Caio. Satiricon. São Paulo: Abril Cultural, 1981.

 

SPALDING, Tassilo Orpheu. Pequeno dicionário de Literatura Latina. São Paulo: Cultrix, 1968.